quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Chef Roberto Strongoli e il pane "dessovado"

O Chef Boulanger Roberto Strongoli, que estudou na The French Culinary Institute em Nova Iorque e hoje exerce diversas funções na área da Gastronomia – dá aulas, apresenta um quadro de culinária no programa Todo Seu do Ronnie Von na TV Gazeta e administra as duas unidades da padaria modelo Le Pâtissier, na Granja Viana e no Shopping Villa Lobos, está aqui hoje conosco para falar sobre il pane "dessovado".


Il pane "dessovado"
Por Roberto Strongoli

Esta é uma receita incrível! É o pão feito através de uma técnica doida-de-tudo que reúne o que tem de melhor no mundo inteiro e foi especialmente desenvolvida para os preguiçosos gourmand de plantão!! Uhu, eita mamata danada né?

Bom, o que acontece neste processo?

Primeiro se notarmos, essa técnica nada mais é que a verbalização técnica da observação do que ocorre naturalmente na massa.

Tudo se desenvolve sozinho, dando oportunidade para termos os ácidos graxos bem presentes, dando cor e sabor bem pronunciados e incrivelmente profundos neste pão.



Preste atenção e você verá que:
-a casca ficará dura mas fina;
-as bolhas de fermentação em sua totalidade vão para perto da casca;
-a cor do miolo fica creme;
-as bolhas tem um brilho interessante que vem de uma fermentação ácida;
-o sabor fica cheio de notas de nozes e outras sementes (isso depende também da farinha)

O aspecto rústico vem do fubá que é usado no final.

Depois de frio o pão se mantém macio por mais 3 dias.

Como chegamos nesta técnica? Bom, ela vai contra o que tem sido feito ultimamente no “mundo industrial”.

Após 1960 os padeiros começaram a adquirir máquinas com duas ou três velocidades, começando assim a nova era da velocidade e outra do declínio da qualidade. Com a necessidade de se produzir mais quantidade em pouco tempo, a indústria aumentou o emprego de químicos na panificação e mudou os tempos de batimento da massa – métodos os quais suprem a pointage (descanso), aniquilando assim a formação de ácidos orgânicos que são responsáveis pelo sabor e shelf-life (vida útil na prateleira) do produto final. Essa superprodução baseada em químicos que permitem um desenvolvimento ótimo do filme de glúten, tem como efeito um maior volume do produto, um miolo mais mole e branco, porém na mesma proporção uma deterioração do sabor que é simplesmente TUDO.

Assim, aqui entra a autolysis – esta técnica descoberta por Calvel em 1971. Ela consiste em misturar água e farinha excluindo todos os outros ingredientes e seguido de um descanso controlado. Isso vai contra os métodos atuais de panificação, porém os valores de qualidade e sabor são resgatados integralmente. Os quais, acredito eu, são os únicos valores que deviam ser mantidos sempre.

O que acontece?
-a massa atinge a maciez mais rápido e reduz o tempo total de mistura reduzindo a oxidação da massa em 15%;
-aumentam as ligações de glúten, amido e água da massa;
-aumenta a extensibilidade;
-facilita a modelagem dos pães;
-aumenta o volume;
-melhora a estrutura das células;
-melhora a cor;
-melhora o sabor.

Vamos à técnica!!

PÃO SEM SOVA ( ou DESSOVADO)
(faz um pão de aproximadamente 700gr)

Ingredientes
400 gr de farinha de trigo e mais um pouco para polvilhar pela mesa
5 gr de fermento seco instantâneo para pão
8 gr de sal
320 gr de água
fubá ou farinha integral de grãos inteiros para colocar por cima e na mesa

Modo de preparo
Num recipiente que caiba tudo, misture todos os ingredientes até formar uma massa “liguenta”. Cubra com um plástico e deixe descansar por 12-18 horas em temperatura ambiente. Estará pronta assim que bolhas se formarem (parecendo a Lua). Coloque essa massa na mesa enfarinhada e dobre ela sobre ela mesmo 2 ou 3 vezes e deixe descansar por mais 20 minutos. Assim que der, jogue mais um pouco de farinha por cima da massa para não grudar nos dedos e tente fazer uma bola (pois esse já será o formato final), bem delicadamente e deixe repousar em cima de mais farinha e fubá coberto por um pano por mais umas 2 horas. Vai crescer bastante ainda.

Na última meia hora coloque no forno uma panela de ferro que tenha uma tampa bem apertada e pesada. Ligue o forno a 200˚C e deixe-a lá. Por fim com a ajuda de uma toalha, tire a panela vazia, coloque a massa de ponta cabeça dentro dela e feche a tampa. Leve novamente ao forno por mais 30 minutos. Tire a tampa e deixe por mais 15 mim ou até o pão ficar da cor desejada, um dourado bem escuro e profundo.

Deixe esfriar e experimente com queijos, geléias, pastrame, vinho, azeite ou como eu gosto: simplesmente quente com manteiga da melhor qualidade que você puder achar e claro, com os melhores amigos que você tiver, pois esta é a melhor manifestação do amor divino em sua pura forma da multiplicação! Entendeu? Não? Então dê sua primeira mordida, olhe ao redor e perceba quem realmente fez o pão!! Uhu!